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Gentil Bonetti: Pediatria gaúcha perde um de seus ícones


A Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul cumpre o doloroso dever de comunicar o falecimento do ex-presidente Dr. Gentil Queiroz Bonetti, ocorrido na última quinta-feira, 15 de junho de 2017.

Gentil Queiroz Bonetti SPRS

O Dr. Gentil Bonetti foi um "ícone" nas doenças infectocontagiosas no Rio Grande do Sul. Formado pela UFRGS em 1961, atuou como professor da FFFCMPA (atual UFCSPA), participando da formação de várias gerações de pediatras gaúchos. Foi diretor médico do Hospital da Criança Santo Antônio, onde trabalhou também na chefia do setor de Isolamento.

Atuante na SPRS, foi o vice-presidente em duas ocasiões - em 1983/1984, na gestão do Dr. Décio Martins Costa Jr.; e em 1985/1986, na gestão do Dr. Antônio Spolidoro. Em 1984 chegou a assumir a presidência, em decorrência do afastamento do Dr. Martins Costa Jr. para estudos no exterior.

Outro ex-presidente da SPRS, Dr. Jefferson Pedro Piva (gestão 1992/1993), lembra com carinho da atuação do mestre, seu professor na antiga Faculdade Católica de Medicina. “Trabalhei com ele por quase 20 anos, e testemunhei o quanto ele era admirado e querido. É uma perda irreparável para a pediatra gaúcha e brasileira”, afirmou o Dr. Jefferson Piva.

Publicamos abaixo um texto em homenagem ao Dr. Gentil Queiroz Bonetti, enviado à SPRS pelo ex-presidente Jefferson Pedro Piva, a quem agradecemos pela colaboração.

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Mestre Gentil Bonetti

Conheci Gentil Queiroz Bonetti em 1977 como seu aluno no Departamento de Pediatria da antiga Faculdade Católica de Medicina (atual UFCSPA) e Médico Chefe da Unidade de Cuidados Infecciosos (UCI) do Hospital da Criança Santo Antônio (ainda localizado na Av. Ceará). Desde os primeiros dias, me chamava a atenção a forma reverente e carinhosa como todos o tratavam: “Mestre Gentil” !

À primeira vista, Gentil Bonetti era sujeito com uma compleição física miúda, com fala mansa e baixa, destacando-se seu olhar atento e perspicaz, o que lhe conferia uma postura humilde e empática. Entretanto, ao observá-lo circular pelos corredores do Hospital da Criança Santo Antônio (HCSA), esta impressão se modificava: identificava-se uma figura ímpar, altiva, segura, atendendo mães, funcionários, colegas, alunos e residentes de forma solícita, atenciosa, e, quase sempre, resolutiva. Sua disponibilidade era uma grande qualidade e de enorme valia para todos nós, pois mesmo sendo esta figura reverenciada, não impunha barreira alguma para acessá-lo a qualquer momento e solicitar sua ajuda!

Deve-se recordar que nesta época as revistas científicas e livros-textos estrangeiros chegavam ao país com um retardo de meses. Gentil compensava este atraso de novas informações através de leitura compulsiva e redução de horas de sono. Este hábito, aliado à memória privilegiada, o tornou referência bibliográfica à época. Na discussão clínica os residentes tinham uma certeza: Gentil acertaria o diagnóstico e daria toda explicação fisiopatológica. O patologista apenas confirmaria a sua explanação. Havia um caso difícil na enfermaria? Os próprios colegas e professores recomendavam: discutam com o Mestre Gentil que ele saberá o que fazer!  E, de fato, o “Mestre” sempre sabia.

Entre 1973 e 1976 o Brasil foi atingido por uma das maiores epidemias de Meningococos que se tem notícia. O Hospital da Criança Santo Antônio era a grande referência para estes casos, tendo alcançado as menores taxas de mortalidade em todo país nos quatro anos da epidemia. Gentil Bonetti e Benito Soviero (seu grande parceiro no HCSA) foram os responsáveis por esta proeza ao inovarem desenvolvendo protocolo de atendimento baseado em acesso venoso precoce, antibioticoterapia imediata, acesso em unidade de isolamento, entre outros cuidados. Na área de infectologia pediátrica, era reverenciado em todo o país pelos resultados obtidos na sua unidade com pacientes desnutridos com as mais prevalentes doenças infecciosas à época (diarreias infecciosas, sepse, estafilococcias invasivas, entre outras). Inovou no atendimento destes pacientes com instituição de suporte nutritivo parenteral, na suplementação de microelementos, na avaliação imunológica, entre outras medidas.

Mesmo sendo um pediatra com intensa atividade hospitalar, Mestre Gentil Bonetti mantinha a visão de pediatra generalista, atuando no posto de saúde visando obter entre seus pacientes uma cobertura vacinal próxima de 100%.

Além de sua obstinação pela prevenção e tratamento de doenças infecciosas, foi também visionário ao implantar o primeiro banco de leite humano de nosso estado, no HCSA. Além de todas estas tarefas, manteve atividade em sua clínica privada e ainda foi presidente da Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, em 1984.

Gentil Queiroz Bonetti não frequentou curso de pós-graduação para defender dissertação de mestrado ou tese de doutorado. Mesmo assim, seus colegas, alunos e residentes dispensaram esta formalidade, e há muito tempo, de forma espontânea decidiram reconhecê-lo como seu MESTRE!  Este grande pediatra nos deixou em 15 de junho de 2017, mas sua bela história segue viva entre nós.

Obrigado por tudo, Mestre Gentil !

Dr. Jefferson P. Piva
Prof. Titular de Pediatria da UFRGS
Chefe do Serviço de Emergência e Medicina Intensiva Pediátrica - HCPA

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